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sábado, 24 de setembro de 2011

Predominância do Simpático: O vínculo entre a disfunção erétil, a aterosclerose e a doença cardiovascular?

A disfunção erétil (ED) afeta 40% dos homens acima dos 40 anos de idade, em algum grau, e dois terços dos homens acima dos 70 anos têm sintomas significativos de ED.
A associação entre a disfunção erétil e a doença arterial coronária (DAC) foi sugerida anos atrás, através de estudos de observação. Mais recentemente foi descoberto que a disfunção erétil é um marcador precoce da DAC, como o canário na mina de carvão*.
De fato alguns estudos têm demonstrado que a aterosclerose co-ronária é muito mais severa em pacientes com ED vascular, com os autores considerando que a ED pode ser um antecipado sinal de alarme de aterosclerose coronária (1).
Uma recente meta-análise de estudos prospectivos de grupos, envolvendo 36.744 participantes, sugeriu que a ED aumenta significativamente o risco de doença cardiovascular, DAC, acidente vascular cerebral, e mortalidade por todas as causas, e que esse aumento seja provavelmente independente dos fatores de risco convencionais (2)
A ereção é iniciada através do sistema nervoso parassimpático, ativação a qual anula o tom simpático que mantém o pênis em um estado não-erétil (flácido). Esse estado é mantido principalmente através da liberação de noradrenalina dos nervos adrenérgicos do pênis. A noradrenalina contrai a vasculatura e o músculo macio cavernoso. A excitação/ereção está associada com a redução da liberação de noradrenalina no pênis, com a liberação de óxido nítrico (NO), e com a redução no tom do músculo macio do pênis. Conseqüentemente, o óxido nítrico é o mediador da vasodilatação parassimpática na função erétil (3). Então, quando o sistema parassimpático é continuamente desativado existe uma redução na produção de NO.
Estilo de vida e nutrição tem sido cada vez mais reconhecidos como fatores centrais influenciando a produção do óxido nítrico vascular e a função erétil. ED está associada com o fumo, excessiva ingestão de álcool, obesidade abdominal, diabetes, hipertensão e decréscimo de defesa anti-oxidante, todos os quais reduzem a produção de NO (4). Recentes estudos têm discutido sobre os benefícios das intervenções no estilo de vida, com hábitos alimentares mais saudáveis, prática de exercícios e se evitar o fumo no sentido da melhoria da disfunção erétil (5) e também almejando a redução de fatores de risco para a doença arterial coronária (4, 6).
É interessante notar que a ED e a aterosclerose tem muitos fatores de risco em comum como, por exemplo, envelhecimento, inatividade física, dieta inapropriada, estresse psicológico, fumo, hipertensão e diabetes.
Com relação a esse ponto existem diversos estudos mostrando que: a) aumentada atividade simpática e estresse mental podem afetar a função erétil com estudos sugerindo que um elevado tom simpático central pode ser uma das causas da impotência psicogênica (7, 8, 9); b) um estudo sugeriu que drogas agindo no sistema nervoso central que reduzam o fluxo simpático anti-erétil e aumentem o fluxo parassimpático pró-erétil para o pênis, podem restaurar a ereção do pênis em casos de disfunção erétil de origem psicogênica e orgânica (10); c) outro estudo demonstrou que pacientes reclamando de disfunção sexual durante o dia e achados por monitoração da ereção relacionada ao sono de sofrerem de disfunção erétil orgânica, tiveram alterado seu balanceamento autônomo cardíaco durante ambos os estágios do sono (11); d) Um estudo mostrou que homens com disfunção erétil idiopática têm evidência de disfunção endotelial têm resistência dos vasos no antebraço, aumento na pressão do pulso e variabilidade da freqüência cardíaca comprometida. Segundo os autores isso suporta o conceito de que a disfunção erétil é um preditor da disfunção cardiovascular e um precursor da doença cardiovascular (13). e) finalmente, um estudo bastante recente mostrou que pacientes com ED exibiram diferente variabilidade na freqüência cardíaca comparada com o grupo de controle normal. Isso sugeriu aos autores que os pacientes com ED possam ter algum tipo de desbalanceamento no sistema nervoso autônomo (SNA) podendo ser possível que o desbalanceamento geral do SNA seja uma das causas de ED (12).
Levando-se em conta os estudos acima e nossa postulação de que a predominância do simpático seja o fator primário na cascata de eventos levando a espiral aterogênica (13, 14), nós temos de presumir que a predominância do simpático seja realmente o vínculo entre a ED e a doença cardiovascular.

*Enquanto o canário está cantando, está tudo bem. No entanto, um canário morto é um alarme para um problema maior

Referências
1. Chiurlia E et al. Subclinical coronary artery atherosclerosis in patients with erectile dysfunction. J Am Coll Cardiol, 2005; 46:1503-6
2. Dong JY et al. Erectile dysfunction and risk of cardiovascular disease. Meta-analysis of prospective cohort studies. J Am Coll Cardiol, 2011; 58:1378-1385
3. Andersson K, Stief C. Penile erection and cardiac risk: pathophysiologic and pharmacologic mechanisms. Am J Cardiol. 2000 Jul 20;86(2A):23F-26F
4. Meldrum DR et al. The link between erectile and cardiovascular health: the canary in the coal mine. Am J Cardiol. 2011 Aug 15; 108(4): 599-606
5. Horasanli K et al. Do lifestyle changes work for improving erectile dysfunction? Asian J Androl, 2008; 10(1):28-35
6. Gupta PB et al. The effect of lifestyle modification and cardiovascular risk factor reduction on erectile dysfunction: A systematic review and meta-analysis. Arch Intern Med, 2011. Published online September 12.
7. Junemann KP et al. Neurophysiological aspects of penile erection: the role of the sympathetic nervous system. Br J Urol, 1989 Jul;64(1):84-92
8. Pagani M. Hypertension, stress and erectile dysfunction: potential insights from the analysis of heart rate variability. Curr Med Res Opin, 2000; 16 Suppl1:s3-8
9. Diederichs W et al. The sympathetic role as an antagonist of erection. Urol Res. 1991;19(2):123-6
10. Allard J, Giuliano F. Central nervous system agents in the treatment of erectile dysfunction: how do they work? Curr Urol Rep 2001 Dec;2(6):488-94
11. Lavie P et al. Cardiac autonomic function during sleep in psychogenic and organic erectile dysfunction. J Sleep Res. 1999 Jun;8(2):135-42
12. Lee JY et al. Heart rate variability in men with erectile dysfunction. Int Neurourol J 2011;15:87-91. Full free text at http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3138849/pdf/inj-15-87.pdf
13. Stuckey BG, Walsh JP ET al. Erectile dysfunction predicts generalised cardiovascular disease. Evidence from a case control study. Atherosclerosis 2007, 194(2):458-64
14. Carlos ETB Monteiro, “Ambiente ácido evocado por estresse crônico: Um novo mecanismo para explicar aterogênese.”, disponível no Infarct Combat Project, Janeiro 28, 2008 em http://www.infarctcombat.org/AcidityTheory-p.pdf (versão em português)
15. Predominância do sistema nervoso simpático: o fator primário na cascata de eventos levando a espiral aterogênica. , Carlos Monteiro, 22 de Fevereiro de 2010 em http://teoriadaacidez.blogspot.com/2010/02/predominancia-do-sistema-nervoso.html

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

O impacto positivo do humor e negativo do estresse sobre a função vascular

O estresse crônico é correlacionado com aumentos do cortisol e catecolaminas, hormônios do estresse. Existe uma forte evidência científica vinculando estados emocionais negativos como a depressão, ansiedade ou raiva, com um risco aumentado na doença cardiovascular. Porém, muito menos é conhecido sobre a associação entre estados emocionais positivos, o tão chamado eustresse, como o riso e a felicidade. O mais agradável de todos os tipos de riso está associado com o humor e é especificado como riso jovial.
A esse respeito existem alguns estudos feitos pelo Dr. Berk e colegas, da Universidade de Loma Linda, demonstrando que em comparação com estresse crônico o riso jovial reduziu os níveis de cortisol em 39%; adrenalina em 70% e dopac em 38%. A conclusão em um desses trabalhos foi de que o humor parece atenuar as catecolaminas e a recorrência do infarto do miocárdio (IM) e conseqüentemente pode ser um efetivo adjuvante no cuidado pós-infarto (1, 2, 3).
De outro lado o Dr. Michael Miller, da Universidade de Maryland, apresentou um estudo junto ao Congresso da Sociedade Européia de Cardiologia, realizado em 2011 (4), o qual enfatizou o vínculo entre a função endotelial e o riso. Seu estudo mostrou que quando as pessoas riem seus principais vasos sangüíneos se dilatam permitindo um fluxo sangüíneo mais fácil, o que indica um reduzido risco de eventos cardíacos.
A idéia do Dr. Miller de estudar emoções positivas como, por exemplo, o riso, aconteceu a partir de estudos que mostraram que o estresse mental leva os vasos sangüíneos a se contraírem. Seu primeiro estudo sobre senso de humor e doença arterial coronária foi publicado em 2001 (5). Em outro trabalho, publicado em 2009 (6), falou sobre os testes feitos para confirmar a hipótese de que o riso jovial também afeta favoravelmente a vasodilatação fluxo-mediada do endotélio dependente (FMD). Dessa forma, os voluntários foram randomizados para duas diferentes fases em um estudo cruzado randomizado. Uma fase incluiu assistir um filme ou segmento de comédias populares (ex: Saturday Night Live) enquanto a segunda fase foi a de se assistir um filme conhecido por promover o estresse mental (ex: O segmento de abertura do “Resgate do Soldado Ryan”). A avaliação da vasoreatividade do endotélio dependente foi realizada através do uso de ultra-som de alta resolução da artéria braquial, também referida como teste de reatividade da artéria braquial (BART). Um total de 160 medidas BART foi realizado o que demonstrou um efeito divergente após se assistir um filme que provocou estresse mental comparativamente com o riso jovial. Especificamente, uma redução de 35% no FMD comparada com a linha base seguiu o estresse mental enquanto ocorreu um aumento de 22% no FMD em resposta ao riso (7). Em 2008 o Dr. Miller e seus colegas, em uma apresentação oral intitulada “Emoções positivas e o endotélio: A música alegre melhora a saúde vascular?”, feita durante as seções científicas acontecidas na Associação Ame-ricana do Coração, concluíram que os benefícios cardiovasculares da música são similares aqueles encontrados nos estudos prévios quanto ao riso jovial (8)
Em 2010 o Dr. Sugawara e seus colegas confirmaram os achados do Dr. Miller dizendo que seus resultados sugeriram que o riso jovial provocado por filmes cômicos induz a um impacto positivo sobre a função vascular (9).
Novamente, em apresentação feita pelo Dr. Miller no ESC, 2011 (4), ele informou que os voluntários assistiram segmentos de um filme cômico em um dia, tal como “Quem vai ficar com Mary” e no outro assistiram ao segmento de abertura do “Resgate do Sol-dado Ryan”). Quando os voluntários do estudo assistiram ao es-tressante filme, seu endotélio desenvolveu uma resposta potenci-almente não saudável chamada de vaso-constrição, reduzindo o fluxo sangüíneo. De uma forma geral, nesse tempo, mais do que 300 medidas foram feitas com uma diferença de 30-50% no diâmetro do vaso sangüíneo entre as fases do riso e do estresse mental (4).
Nós pensamos que os estudos acima dão uma evidência adicional para nossa teoria da acidez na aterosclerose (10), que tem a seguinte seqüência de eventos:
I. Dominância simpática por estresse contínuo mais
II. Deficiência na produção de componentes endógenos do tipo digital (digitalis-like compounds – DLCs) com alterações na atividade da Na(+), K(+)-ATPase resultando em:
III. Redução no pH (acidez) o que aumenta a pressão de perfusão e provoca efeitos na contratilidade das artérias coronárias levando a mudanças na tensão tangencial hemodinâmica e aterosclerose como conseqüência.
Carlos Monteiro
1. Berk LS, Tan SA and Berk B. Cortisol and cathecolamine stress hormone drecrease is associated with the behavior of perceptual anticipation of mirthful laughter. The FASEB Journal. 2008; 22;946.11
2. Tans SA, Berk LS et al. Humor as an adjunct therapy in cardiac rehabilitation, attenuates cathecolamines and myocardial infarction recurrence. Adv Mind Body Med 2007; 22(3-4): 8-12
3. Berk LS et al. The neuroendocrine and stress hormone changes during mirthful laughter. Am J Med Sci 1989;6:390-396
4. Miller M. Laughter and vascular function, ESC 2011.
5. Clark A, Seidler A, Miller M. Inverse association between sense of humor and coronary heart disease. Int J Cardiol. 2001 Aug; 80(1):87-8
6. Miller M, Fry WF. The effect of mirthful laughter on the human cardiovascular system. Med. Hypothesis 2009; 73(5):636 . Full free text at http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2814549/pdf/nihms-154943.pdf
7. Miller M, Mangano C, Park Y, et al. Impact of cinematic viewing on endothelial function. Heart 2006; 92:261-262
8. Miller M, Beach V, Mangano C, Vogel RA. Positive emotions and the endothelium: Does joyful music improve vascular health? American Association Scientific Sessions, on 11/11/2008
9. Sugawara et al. Effect of mirthful laughter on vascular function. Am J Cardiol 106:856-9 (2010).
10. Carlos ETB Monteiro, “Ambiente ácido evocado por estresse crônico: Um novo mecanismo para explicar aterogênese.”, disponível no Infarct Combat Project, Janeiro 28, 2008 em http://www.infarctcombat.org/AcidityTheory-p.pdf (versão em português)